segunda-feira, 28 de novembro de 2011

Criadores e criaturas



Alan Moore em momento descontraído
Os protestos em Wall Street renderam comentários de dois dos maiores escritores de quadrinhos de todos os tempos: Frank Miller e Alan Moore. A opinião de Miller todo mundo sabe. É reaça e pronto.
Moore, por outro lado, parece ter gostado da ideia de os manifestantes usarem a máscara de um personagem seu. Este blog gostou também.
O omelete publicou uma matéria bem interessante a respeito:

Alan Moore comenta o uso das máscaras de V de Vingança em protestos pelo mundo Quadrinhos | Omelete

domingo, 27 de novembro de 2011

Quem tem medo da verdade? Por Angeli



Motivos para invejar a Argentina

Por aqui, o que acontece do outro lado do rio parece ser muito mais distante do que o que acontece no outro lado do oceano e no hemisfétio norte. O que acontece lá, para além das bandas de Uruguaiana, parece ser sempre menor, irrelevante ou sem qualquer significado para as corporações midiáticas que mandam nas tevês e temem a internet. A única razão que orienta a compreensão televisiva sobre a Argentina parece ser o futebol. Mas, o que fazer quando esta parece ser a razão de existir de algumas figuras que infestam a grande mídia? Em alguns lugares, como no sul do sul do Brasil, se sabe um pouco mais da Argentina, se vai além de se reconhecer como país de Maradona e de Messi. Mas, do pouco que se sabe daquela terra tão perto e tão longe, é possível deduzir alguns motivos para que possamos invejá-los. Segue uma breve demonstração de um país que viabiliza o exercício do direito à memória, tão curta e subestimada por aqui.
Na Argentina golpistas e torturadores da ditadura militar piam fino. Lá, pelo que se percebe, milico não tem muito espaço para, postado como um chester-peito-duplo-com-medalhas, defender ditadura. E quando comete tal façanha, a justiça não tarda em enquadrar o sujeito. Existe compromisso social, desde os poderes da República, passando pela sociedade e pela imprensa, de não haver tolerância posturas anti-democráticas saudosas da ditadura militar que por lá grassou.
Lá a justiça pune torturadores, sejam generais ou coronéis, de forma exemplar, como o abominável Videla. A afirmação é auto-explicativa. Por aqui o assunto é quase um tabu, e, quando é abordado por grandes corporações, sempre vem de modo muito tolerante e mansinho em relação aos golpistas. Por lá, golpistas e torturadores são julgados e condenados pelos crimes que cometeram, ao mesmo tempo em que se afirma o direito à memória, a justiça e a democracia.
Espera-se que por aqui a Lei 12.528, de 18 de novembro de 2011, produza bons resultados, com seu propósito de de efetivar o direito à memória e à verdade histórica e promover a reconciliação nacional, ao invés de esconder os esqueletos nos armários. Mas, para além da lei, se faz necessário maior compromisso com a verdade histórica e o direito à memória por parte das grandes corporações midiáticas.

De André Dahmer, do malvados


DO MESMO AUTOR, uma frase certeira sobre os preconceitos de cada dia: "os gordos são os novos pretos".

A primavera árabe (os jardineiros e as alergias)

Durante o ano de 2011 muito se falou e se comentou sobre a dita “primavera árabe”, a série de eventos ocorridos no norte da África e no Oriente Médio, com grande cobertura de jornalões e de grandes corporações de comunicação. Tal primavera surgiu nas telas como marco da “luta por democracia” naquela parte do planeta, como se a tomada da Bastilha fosse revisitada, encenada em novo cenário, as terras áridas e, segundo o senso comum globalizado, infestadas de terroristas ou homens-bomba em potencial. Deu-se, invariavelmente - com louváveis exceções entre as grandes redes -, a impressão de que o oriente médio entraria na era da democracia, assim, aparentemente tão de repente como um toque de mágica, geral e irrestrito, absoluto, capaz de transpor fronteiras e diferenças étnicas e religiosas do mosaico árabe.

Mais uma vez proclamou-se o discurso da solução única, conteúdo da democracia-com-maior-abertura-das-economias, simples e direta (afinal outra forma de democracia não seria tão democrática). Subestimou-se, como de praxe, a inteligência de qualque reflexão mais cuidadosa, com uma abordagem orientada por interesses essencialmente econômicos, totalizante dos fatos manipulados para exposição midiática, sem apontar a complexidade e o limite dos mesmos. Enfim, parece que por lá todos, ao mesmo tempo, querem (e devem) começar a realizar o american way of life.Não se tem a pretensão de fazer uma análise de maior profundidade, não se ousa tanto: cabe aqui apontar alguns pontos sobre as flores metafóricas da tal primavera, seus jardineiros e desagradáveis alergias relacionadas ao período, lembrando que estas se manifestam de modo involuntário, refletindo o contexto em que surgem. A primavera árabe suscita também alergia teocrática ou autoritária à democracia. Figuras de linguagem, para além do apelo do estilo, se prestam também para disfarçar os fatos e, especialmente, os interesses em debate.
Uma brevíssima análise da história recente do Oriente Médio aponta alguns exemplos interessantes, que comprovam as peculiaridades e riscos daquele cenário políti
co e econômico, cheio de petróleo, quase sempre com o protagonismo de lideranças religiosas (ou político-religiosas – há naquelas bandas a indistinção entre política, Estado e religião). No final dos anos 1970, no Irã, uma “revolução” retirou do poder o xá autoritário, mas simpático aos interesses ocidentais, e no seu lugar afirmou uma teocracia de dar inveja aos mais reacionários sonhos e fetiches opusdeísticos. Um retorno à Idade do Bronze em pleno 1979, com a benção dos aiatolás, especialmente do famoso Khomeini. O tio Sam, abalado, não tardou a encontrar liderança na região que se prestasse aos seus fins: no Iraque, vizinho ao Irã, foi buscar em Sadam Hussein alguém para promover seus interesses, e promover a guerra Irã-Iraque, com sua década de mortes, fundamentalismos e armas químicas. No período até o Brasil lucrou com a matança: vendeu o lançador de foguetes astros II, blindados e até carros modelo Passat. Sadam, à época governava com mão-de-ferro o Iraque, mas se prestou ao papel “da liberdade” da vez. Algo que não se comentava no período era a crueldade de Sadam com seus adversários políticos dentro do Iraque, o que ficou bastante claro após, quando se tornou mais interessante ocupar e lotear o Iraque, tomar seu petróleo e matar Sadam, uma verdadeira encarnação do asmodeu segundo Bush pai e Bush filho. Houve primavera no Iraque? Apesar do termo não estar em voga quando da ocupação, tentou-se, à força, impor a democracia (!?) aos iraquianos, os quais apresentam indícios de que não tardaram a eleger líderes xiitas e a implantar lá uma teocracia.
Outro lugar, outro cenário, parecido em parte pelos credos dominantes e pela aridez do solo de boa fração de seu terr
itório é o Afeganistão. E lá se tem outro exemplo interessante sobre figuras de linguagem aplicadas ao mundo árabe. Aquela terra sempre foi muito difícil de ser conquistada, dominada e ocupada pela civilização ocidental. A Inglaterra tentou, não conseguiu. Pelo lado “do mal” a União Soviética tentou durante uma década, passou vergonha, fez lá seu Vietnã e bateu em retirada no final dos anos 1980. Entre os sujeitos que lutaram contra a tirania atéia soviética, destacaram-se os mujahidin, dentre os quais emergiu a liderança de Osama Bin Laden e sua turma, os talibãs. Hoje, “talibã” serve para identificar pessoa fundamentalista, extremista, terrorista, ou mesmo pessoas intransigentes, teimosas e retrógradas. À época da ocupação soviética, talibãs eram apresentados como justos defensores de seus territórios, povo aguerrido e simples que tinha que lutar, sobre cavalos, contra a máquina militar de uma potência nuclear. No filme-porcaria Rambo III, feito da propaganda anti-soviética norte-americana, os talibãs são apresentados como homens batalhadores, que lutam pela liberdade enquanto ajudam Rambo a trucidar soldados do “império do mal”. São chamados de “cavaleiros da liberdade” (!!!???) pelo governo Reagan, que treinou, forneceu informações e armou o fundamentalismo afegão. Para entender o papel dos norte-americanos, especialmente da CIA e dos stingers durante o conflito, um filme é interessante: jogos do poder. O que ocorreu depois nem é preciso comentar, mas a conveniente alcunha de cavaleiros da liberdade seria a última, hoje, a ser posta aos talibãs. Estes, ainda seguem tocando o terror e tem apoio de boa parte da população afegã para (re)afirmação de outra teocracia com burca.

De volta para o presente, estamos a perceber que os jardineiros da primavera árabe não são tão jardineiros assim, considerando que possuem certa alergia ao pólen da primavera democrática de modelo ocidental, que de metáfora, como se percebe, parece que não passará. Pelo menos é o que apontam os acontecimentos primaveris. Alguns sujeitos que, segundo os jornalões, poderíamos chamar de “jardineiros com alvará”, legítimos, ou seja, defensores da democracia padrão ISO 2011 (neoliberal), já amargam seus lugares em masmorras ou a sete palmos no subsolo. É o que tem se visto nos conflitos da primavera egípcia: após a queda de Mubarak, uma junta militar assumiu o poder e não quer largar o osso. O pau continua cantando na terra das pirâmides e parece que a brisa democrática não virá tão cedo - foi substituída pelo calor das bombas policiais e dos canos de fuzis, com uma ditadura militar no horizonte.

O ditador mais espalhafatoso de nossos tempos encontrou seu fim na primavera Líbia. Kadhafi (ou Gadhafi) acabou sendo trucidado por seus compatriotas, do mesmo modo como fazia com quem não gostava de suas roupas e de seu governo. Este ditador teve azar: seus opositores contaram com o apoio da OTAN para acabar com as “poderosas” forças militares de Kadhafi. Considere-se que a Líbia possui valiosos poços de petróleo a serem rateados entre empresas não-líbias nos próximos anos. A primavera Líbia aparentemente ainda não cessou, mas tende a terminar com a exclusão do povo líbio dos melhores e mais rentáveis frutos de sua própria terra.

Na Tunísia a primavera também é conhecida pelos tunisianos como a revolução de jasmin, uma onda de protestos violentos turbinados pelos altos índices de desemprego e pela corrupção governamental, que resultou na renúncia do presidente Zine Al-Abidine Ben Ali. Até aí tudo bem, tudo no clima primavera. Mas, não esqueçamos que por lá, para boa parte da população, Estado, religião e política constituem um todo monolítico, e, consequentemente, nas eleições sempre surgem partidos, digamos, confessionais. Verdadeiro sonho de alguns pastores e padres daqui, tais partidos conseguem boas votações da clientela fiel, como o exemplo do tunisiano partido islâmico Ennahda, mais votado nas eleições realizadas de outubro com mais de 40% dos votos (90 dos 217 assentos da assembleia constituinte).

Cabe lembrar que o fogo no rastilho de pólvora da primavera começou na Tunísia, se esparramando de leste a oeste, do norte da África até o Oriente Médio. Em alguns países a primavera se transformou em verdadeiro inferno para quem se dispôs a lutar por mudanças, como o exemplo da Síria, onde a matança de manifestantes segue dia a dia, sem que as potências ocidentais façam alguma coisa. Claro, lembremos que existe uma distância grande entre defender ideais de liberdade onde tem muito petróleo e simples ideais de liberdade e democracia. De qualquer modo, assim como em outros países da região que tentam realizar sua própria primavera, no lugar de ditadores não se impõem, necessariamente, proposições de Estados e governos democráticos: em muitos se percebe o risco de substituir uma ditadura por outra ou de se estabelecerem governos teocráticos. Modelos que pareciam ser da moda primavera de 2011, serão substituídos por políticas do tipo que estimula o uso de véus e condena tudo que pareça libertinagem. Obviamente, não se pode desprezar o caráter ocidentalizado, em termos, de alguns dos países da região, os quais, a princípio, estão menos suscetíveis as influências de grupos fundamentalistas que, entretanto, constituem um espectro muito influente na região. Naquele contexto, a possibilidade de constituições serem confundidas com o Corão não é de se desprezar. Infelizmente, para boa parte dos caras que moram por lá, minissaia vai continuar sendo vestimenta das mulheres de longe, muito longe, só vistas em fotos. Minorias, mulheres, dissidentes e outros que não crêem ou não concordam hão de continuar na corda-bamba, mesmo depois da primavera.

sábado, 26 de novembro de 2011

review de hq. Batman: ano um

A panini comics está fazendo um belo trabalho com as republicações de clássicos dos quadrinhos Marvel/DC. Sempre com acabamento de luxo, extras em profusão e uma boa tradução, a editora vem dando uma nova oportunidade para os leitores iniciantes conhecerem obras que marcaram a história das hq's.  É o que acontece mais uma vez aqui, com o relançamento da obra-prima de Frank Miller e David Mazzucchelli, "Batman: ano um".

edição da Panini lançada recentemente
Retomando a parceria que já havia rendido a seminal "Queda de Murdock", em 1986, Miller e Mazzucchelli foram contratados pela DC para recontar a origem do homem-morcego após o evento "crise nas infinitas terras". Para quem não lembra, a "crise" (a primeira de muitas que a DC promoveria desde então) foi uma espécie de "reboot" do universo DC, no qual antigos personagens ganharam novas origens e tratamento mais contemporâneo. Depois de entregar o Super-Homem para John Byrne e a Mulher-Maravilha para George Pérez (que também fizeram trabalhos excelentes), a major americana convidou Miller para uma pequena repaginada na origem do homem-morcego. O convite veio logo após o impacto da publicação de outra grande obra de Miller, "O cavaleiro das trevas". Esta, em conjunto com "A piada mortal", de Alan Moore, e "Ano um", forma a tríade das melhores histórias do Batman de todos os tempos, leitura obrigatória para todos os fãs do morcegão.
Diferente do que aconteceu em "Cavaleiro dos trevas", onde ficou com o roteiro e a arte, aqui Miller se encarregou apenas da história, deixando os desenhos para o mestre Mazzucchelli. E, assim como tinha acontecido em "A queda de Murdock", os dois produziram uma obra marcante do início ao fim. 

a gênese do herói
A trama, a princípio, é uma típica história de origem, mostrando os primeiros dias de Bruce Wayne em sua cruzada contra o crime. Está quase tudo lá: a motivação em razão da morte de seus pais, a preparação física e mental, o auxílio precioso de Alfred, a participação de Harvey Dent (o futuro Duas-Caras) e o início da amizade com o então tenente James Gordon. No entanto é a forma de contar a história que, como sempre, faz toda a diferença. Não satisfeito em mostrar Gotham como uma cidade podre, comandada por políticos corruptos e patrulhada por policiais idem, Miller dá um aprofundamento psicológico jamais visto aos já conhecidos personagens da DC. Bruce Wayne surge como alguém preparado e ciente de sua missão como defensor da cidade, mas ao mesmo tempo comete erros e é inseguro quanto ao melhor método a utilizar no combate ao crime. A brilhante sequência em que Batman evita um assalto mas quase mata um dos assaltantes é emblemática e nos dá a perfeita noção da gênese do herói. Gordon, por sua vez, aparece como o personagem mais interessante da trama, um policial veterano que representa o último vestígio de honestidade em uma cidade tomada pela corrupção. Pressionado pelo comissário e pelos colegas, em nenhum momento ele dá mostras de que seu caráter será modificado, mas simultaneamente se envolve em um caso amoroso fora do casamento, falha várias vezes e ganha sua redenção ao final da história.

bela sequência criada por Mazzucchelli
Artista ímpar em seu ramo, Mazzuccheli marcou época mais uma vez com "Batman: ano um". Sua arte econômica e expressionista casa maravilhosamente bem com os diálogos precisos de Miller. Valendo-se de enquadramentos por vezes inusitados, o desenhista contribui, e muito, para a ambientação perfeita de Gotham City. Nesta hq a cidade revela-se como um verdadeiro personagem, praticamente interagindo com os protagonistas da trama, em uma simbiose raras vezes encontrada nos quadrinhos de super-heróis. Não é `a toa que Mazzucchelli tem sido premiadíssimo por sua obra autoral recente, algo que representa um tardio reconhecimento ao trabalho desse grande desenhista.

                                            cena de "Batman Begins inspirada em "Ano um"

A edição da panini está lindíssima, com prefácio do editor Denny O'Neill e esboços de Mazzucchelli. Para melhorá-la, talvez a DC pudesse ter convidado Christopher Nolan para escrever um pequeno texto também, tendo em vista a clara inspiração de "Ano um" para o roteiro de "Batman Begins". Como os fãs bem sabem, sequências inteiras do filme de 2005 dirigido por Nolan foram tiradas diretamente da hq, como o ataque dos morcegos, a chegada de Bruce a Gotham e até mesmo a carta do Coringa no final, dando um gostinho do que aconteceria em "Batman: o cavaleiro das trevas". Mais recentemente, a Warner lançou uma elogiada animação baseada na hq. De qualquer forma, é sempre recomendável a leitura do texto original, que comprova o talento de Miller como um dos grandes nomes dos quadrinhos dos anos 80 e até nos faz esquecer suas recentes e polêmicas declarações sobre o movimento de ocupação de Wall Street.

capa do DVD da animação que adapta a hq

quinta-feira, 24 de novembro de 2011

Vingadores


Para evitar que as traças tomem esse blog, vou postando uma ilustração com os Vingadores. Não sou muito fã da equipe, mas achei que ficaria bacana um poster destes, ou, quem sabe até um quadro em acrílico na parede da minha sala. Antes que o Paulista pergunte, não sei quem é o autor.

segunda-feira, 21 de novembro de 2011

Dave Grohl é o cara!

Não bastasse ele ter sido o baterista do Nirvana, Dave Grohl conseguiu forjar uma carreira musical invejável ao longo das últimas duas décadas. Distanciando-se e o mesmo tempo se mantendo fiel ao espírito "grunge", o faz-tudo do rock conseguiu alçar o Foo Fighters ao patamar de superbanda, principalmente com o lançamento do recente - e excelente - "Wasting Light". Extremamente bem produzido, com canções memoráveis, o disco é, sem dúvida, um dos melhores dos últimos anos e provavelmente o melhor trabalho da banda. Lembrando que o Foo Fighters se apresenta no Brasil no ano que vem, é salutar postar um vídeo em que Grohl e sua trupe "quebram tudo" em um memorável show em Wembley. Tudo com uma pequena ajuda de uns certos "velhinhos" do rock.

domingo, 13 de novembro de 2011

Em plena Porto Alegre, Pearl Jam ensina como provocar catarse coletiva

O último show da turnê do Pearl Jam pelo Brasil fechou de forma maravilhosa a passagem da banda por aqui e confirmou algo que os fãs já sabiam de longa data: o verdadeiro rock and roll se faz com paixão, emoção e competência.
Desde a abertura dos portões do estádio do Zequinha a noite prometia ser única para as cerca de vinte mil pessoas que foram conferir os veteranos de Seattle. A abertura contou com a banda gaúcha Wannabe Jalva, que faz um som bem competente, porém sem provocar grande empatia na plateia. Na sequência, o X mostrou um punk rock de altíssimo nível, com pegada e muito carisma. Interessante foi notar que seus integrantes assistiram a toda a apresentação da banda brasileira e, pelo visto, curtindo bastante.
Ao final da apresentação dos californianos, a primeira grande surpresa da noite: Eddie Vedder entrou para cantar a última música e a emoção começou a tomar conta de todo o estádio, algo que chegaria ao ápice em vários momentos do show do Pearl Jam durante o restante de uma noite mágica.
Com pouquíssimo tempo de atraso, Eddie Vedder e cia. fizeram o estádio tremer com, de cara, dois petardos: "why go" e "do the evolution". Com a plateia na mão, seguiram emendando canção atrás de canção, sempre com uma entrega absurda e uma virtuose inacreditável. Eddie mostrou-se um gigante do rock, comandando a massa e cantando sempre muito bem. Incrível a forma como ele amadureceu como artista ao longo dos anos, sem nunca perder sua integridade. 
Vedder e Gossard em noite antológica
Talvez uma das grandes características do Pearl Jam seja mesmo o despojamento, ou seja, a eliminação de tudo aquilo que é supérfluo para que somente o que verdadeiramente importa apareça. Músicas como "given to fly", "elderly woman behind the caunter in a small town", "unthought know" e "daughter" foram momentos de absoluta sintonia entre banda e público. Se pauladas como "even flow" e "rearviewmirror" serviram para mostrar que o Pearl Jam sabe como "quebrar tudo" no palco, foram as surpresas "oceans", "crazy mary" e "state of love and trust" que tornaram toda a experiência muito mais especial e incrivelmente única. No entanto foi com "given to fly", "black", "jeremy" e "alive" que a palavra "catarse" fez todo o sentido para os fãs. Como encontrar outra expressão que represente a emoção de escutar esses clássicos ao vivo? Como não reconhecer esses momentos como ímpares e absolutamente marcantes?
A energia que permeou o estádio do Zequinha foi tamanha que, ao escutarmos a cover dos Ramones "i believe in miracles", tenho certeza de que todos nós também acreditamos, pelo menos por alguns instantes, que o mundo pode ser, sim, um lugar melhor. Desde que, é claro, o Pearl Jam continue existindo...

quarta-feira, 9 de novembro de 2011

...since i've rock and rolled

Entretanto, como dizia no início do post anterior, a música era o que realmente importava. E o conteúdo musical deste álbum é aquele que que há de melhor em termos de rock and roll até hoje. Se Eric Hobsbawn fosse crítico músical, certamente diria que a década de setenta inicia lá por 1968, marcada pela geração flower-power e o Woodstock, e termina por volta de 1976 ou 1978, já moribunda com o advento do punk e da disco. Assim, o ápice da década de 1970, e, por conseguinte, de todo o rock and roll, encontra sua melhor representação neste verdadeiro clássico.

Não é para menos. O quarto album é o Led no auge de sua maturidade e popularidade. Após o decepcionante lançamento de Led Zeppelin III, com sua irregular mistura de porradas do porte de Immigrant Song com números acústicos puxando para o folk, pairavam dúvidas sobre as possibilidades criativas da banda e que direções tomaria. Os quatro cavaleiros britânicos do apocalipse se infurnaram na Hadley Grange para gravar no Rolling Stones Mobile Studio. Sim, aquele famoso Rolling Truck Stones que quase pegou fogo numa famosa sessão em Montreux, às margens do Lago Genebra.

As sessões contaram com a ilustre participação de Ian Stewart, que havia tocado piano com os Stones. Daí gravaram uma versão de Oh My Head, de Richie Valens, injustamente rebatizada como Boogie With Stu, sem dar os devidos créditos. Anos depois, a banda perderia um processo movido pela mãe do falecido cantor de La Bamba.




De qualquer forma, esta canção só seria lançada no Physical Graffiti. O mesmo aconteceu com a magnífica Down By The Seaside. A princípio, a banda pensava em lançar o álbum sem nome no formato duplo, mas Peter Grant foi cauteloso após o aparente fracasso comercial de Led III. De qualquer forma, a escolha foi acertada. Um vinil perfeito, com quatro músicas de cada lado.

O lado A começa abre com chave de ouro, com os vocais de Plant em acapella (inspirada em Oh Well, do Fleetwood Mac), falando sobre uma mulher de pernas longas e sem alma, alternados com o matador riff idealizado por Jonesy após ouvir Tom Cat, de Muddy Waters. Depois de ouvir Black Dog pela primeira vez, minha vida nunca mais foi a mesma. Sabia que aquilo era uma viagem sem volta para o mundo do rock and roll.











O disco que representa o auge do rock and roll, na sua forma mais brutal e, ao mesmo tempo elegante, não poderia deixar de ter uma música com o nome de... Rock And Roll. Nada mais, nada menos que o velho twelve-bar-blues de três acordes, acompanhado pela bateria peso-chumbo de Bonzo e a guitarra furiosa de Pagey. Merece registro a participação de Stu e seu piano forte. Uma verdadeira homenagem aos mestres Little Richard e Chuck Berry, sem os quais nada disso seria possível. Quando ouvi Rock And Roll pela primeira vez, tive realmente certeza que minha vida nunca mais seria a mesma.


Depois de dois petardos sonoros, segue um número acústico. A bela The Battle Of Evermore e seus maravilhosos bandolins mostram o lado mais eclético da banda, com suas influências de música celta. A letra de Plant mostra toda sua admiração pela obra do carola J.R.R. Tolkien, ironicamente um ídolo dos hippies. Como faria um bardo na Idade Média, o dueto com Sandy Denny conta a epopeia de O Senhor dos Aneis, fazendo menção aos Cavaleiros Negros, a rainha da luz Eowyin, o príncipe da paz Aragorn, e o senhor das trevas Sauron. Mostra uma musicalidade e elegância que diferenciaria o Led para sempre das outras bandas de hard rock e protometal da época. À essa altura, já ficaria muito difícil para a crítica especializada baixar o cassete.

Segue então o maior sucesso comercial da banda. A música que seria até hoje a mais tocada nas rádios americanas. Stairway To Heaven faz uma síntese das facetas acúsica/elétrica da banda. Uma balada que culmina numa apoteose de solos de guitarra e riffs heavy metal. Isso sem mencionar a bela letra de Plant e suas referências pagãs. Fala de uma senhora rica e arrogante, que acredita que pode comprar tudo, inclusive uma escada para o céu. Fala sobre um flautista, que ao final levará à razão. Sobre a promessa de um novo dia à todos aqueles que aguardaram por muito tempo. Fala sobre o triunfo da natureza, quando as florestas rirão por último. Quase um poema libertário. Não é a toa que até hoje arrepia alguns conservadores da "maioria moral".

O lado B só confirma toda a competência da banda. Misty Mountain Hop volta ao tema de O Senhor dos Aneis. Só, que desta vez, sob a ótica de hippies maconheiros perseguidos pela polícia, que bem preferiam estar em montanhas nebulosas, aonde voam os espíritos. Destaque para o riff marcante e os teclados de Jonesy.

A belíssima Going to California é uma canção de amor sobre uma garota hippie da California, com amor nos olhos e flores no cabelo, que toca violão, chora e canta. O estranho verso "The mountains and the canyons started to trumble and shake" é uma referência direta à um terremoto ocorrido à época das gravações.




Four Sticks mostra toda a fúria de Bonzo, usando quatro baquetas na gravação.

O disco fecha em grande estilo com a pesadíssima When The Levee Breaks. A letra cantada por Plant é mais um velho blues não creditado. Mas o som da batera de Bonzo ecoando por um grande salão é algo que nunca tinha sido feito até então. Até hoje é um efeito buscado pelos técnicos de estúdio. Ainda há a sacada genial de gravar a fita e reproduzir em slow motion, acentuando o caráter arrastado e pesado da faixa.

O álbum dos quatro símbolos é um clássico absoluto. Uma verdadeira obra prima. Daquelas que não parece ficar datada com o passar dos anos. Obrigado, Mr. Page, Mr. Plant, Mr. Jones e Mr. Bonhan. Sem vocês, minha vida certamente não seria a mesma. E acredito que o mesmo ainda acontecerá com as gerações de roqueiros que virão.

terça-feira, 8 de novembro de 2011

It's been a long, long time...



Há exatos 40 anos atrás, a humanidade recebia um verdadeiro presente dos deuses. Um album que representaria o rock and roll no seu auge. Claro que estou falando do famoso assim chamado Led Zeppelin IV, também conhecido como "álbum dos símbolos", ou mesmo "Zoso".

Nesses atuais tempos bicudos, em que uma cantora de poperô de quinta, que faria corar de vergonha aquelas cantoras de Italo House (pela péssima música, friso, não pela rebeldia de boutique milimetricamente coreografada), é considerada uma "artista talentosa e promissora" por chocar o mundo (essas coisas AINDA chocam alguém) fazendo coisas que Nossa Senhora Imáculavel Madonna (o mais sucedido embuste da indústria fonográfica) já fazia desde a fase Material Girl, é difícil imaginar como uma banda possa ter lançado um álbum sem qualquer coisa escrita na capa possa ter feito sucesso.

Mais difícil ainda, fica imaginar que este álbum seria o segundo mais vendido de todos os tempos (perdendo somente para uma coletânea de uma famosa banda americana one-hit-wonder). E, em tempos pós-MTV, quando a estética e a atitude passou a ser tudo, e a música apenas um elemento coadjuvante na indústria fonográfica, seria insano dizer que alguma banda pudesse obter sucesso sem apelar para o jabaculelê. Mais estranho ainda seria imaginar que esta banda sequer lançava singles para serem tocados nas rádios. Mesmo assim, essa banda, ao mesmo tempo que repudiada pela crítica intelectualoide, era tão avessa ao circuito comercial, conseguiu lançar a música que seria a mais tocada até hoje nas rádios americanas.

O Led era realmente um paradoxo. Jimmy Page e cia. não davam a mínima para a imprensa musical, para as rádios e à televisão. Mesmo assim, conseguiam lotar shows com hordas de fãs enlouquecidos. O legado do quarteto entrou para a história, e nem o movimento iniciado com a boy band de Malcolm McLaren conseguiu apagar a imagem sensual de Robert Plant escorado sobre o soturno Pagey fazendo um solo de guitarra. Taí Axl Rose e Slash, que não me deixam mentir.

Embora avesso à exposição da mídia, o Led criou uma iconografia peculiar. A opção por lançar um álbum sem nome e sem qualquer referência à banda na capa foi idealizada por Page, que à época não aguentava mais a crítica músical, que só baixava o porrete na banda.

Jimmy fez questão de expor claramente seu interesse pelo ocultismo, enchendo a arte gráfica de referências e simbologias pagãs. De um lado do encarte, temos a letra de Stairway to Heaven e uma gravura com a suposta imagem do Mago John Dee.






Do outro lado, os famosos quatro símbolos, cada um representando um membro da banda.





Jonesy e Bonzo escolheram os seus de um livro de magia apresentado por Pagey. O signo de Jonesy representa um homem confiante da sua função, algo digno do músico mais experiente do quarteto. O de Bonzo representa um homem de família. Plant desenhou o símbolo da peninha dentro do círculo, fazendo alusão à cultura indígena americana, assim como à pena do filósofo e mais alguma alegoria egípcia.

O ZoSo de Pagey continua até hoje um mistério. Alguns falam que representaria Cérbero, o cão de três cabeças que guarda o Inferno. Seria esse o tal Black Dog?. Outros dizem que o oSo seria o 666 (e por sua vez, a Besta do Apocalipse, Aleister Crowley), enquanto o Z seria uma forma estilizada do signo de Capricórnio. De qualquer forma, até hoje Pagey guarda o misterioso símbolo como se fosse o Terceiro Segredo de Fátima.




Igual mistério é a autoria do desenho do Eremita. Jimmy Page disse que era uma ilustração criada por um misterioso amigo seu, do qual ninguém nunca ouviu falar. Especula-se que tenha sido desenhado pelo próprio Pagey, que chegou a frequentar a Escola de Artes. De qualquer forma, sabe-se que a imagem representa a carta homônima do Tarot e tem ligação direta com as práticas telêmicas.



Há ainda quem diga que, olhando a capa junto a um espelho, enxerga-se um cão de duas cabeças. Outra alusão ao Cérbero, de três cabeças? Tenho minhas dúvidas. Lembro que até um disco do pagodeiro Belo tinha uma imagem de demônio desse tipo. Se bem que, se este já tinha envolvimento com traficantes do morro, não seria estranho esperar que também realizasse um trato com o cramunhão para ter sucesso. Somente sucesso, repise-se. Faltou pedir talento para o coisa-ruim. Mas, como já havia mencionado no início do post, hoje em dia o fato de a música ser boa ou ruim é o que menos importa.

É certo que toda a iconografia pagã do Led até hoje arrepia pastores do Bible Belt. Há diversas publicações denunciando as chamadas mensagens subliminares satânicas contidas em Stairway To Heaven quando se roda o disco ao contrário. Desnecessário dizer que todas estas publicações são do mesmo nível daquelas que falam a mesma coisa sobre o Harry Potter. De qualquer forma, acho que a direita cristã tem certa razão em chamar o Led de satanista. Do mesmo jeito que teria razão se acusasse os membros deste blog de comunistas.










sexta-feira, 4 de novembro de 2011

rock and roll can never die

Ontem o Pearl Jam começou sua turnê pelo Brasil. Segunda vez que Matt Cameron, Mike McCready, Jeff Ament, Stone Gossard e o grande Eddie Vedder vêm ao Brasil. Motivo de sobra para todos aqueles que são fãs de boa música comemorarem. Afinal, não é todo dia que temos a chance de assistir a uma banda tão intensa, sincera e competente como o Pearl Jam fazendo o que sabe fazer melhor: rock and roll sem frescuras, pirotecnias ou grandes aparatos publicitários. Impressionante como eles se mantiveram fiéis a seus princípios e não se renderam ao caminho mais rasteiro para o sucesso. Após o sucesso de "Ten", fantástico álbum de 1991, os caras poderiam ter repetido a mesma fórmula nos discos seguintes que cairiam tranquilamente nos braços do mainstream. Mas não. Inquietos e rebeldes, compraram briga com a ticketmaster, se envolveram em causas sociais, fizeram grandes parcerias com gigantes como Neil Young e  U2, sem nunca abandonar suas raízes. De quebra, Eddie Vedder ainda manteve uma carreira solo admirável, tendo lançado em 2007 o belo álbum "Into the Wild", trilha sonora do excelente filme de Sean Penn. Se a postura da banda fez com que pagassem o preço em termos de popularidade, em contrapartida ganharam uma legião de fãs extremamente fiéis e admiradores das letras contundentes e da postura política do Pearl Jam. Claro que, ao fim e ao cabo, o que importa mesmo é a música. E nesse quesito eles são nada menos do que excelentes. Tiveram seus altos e baixos, mas nos legaram canções marcantes, muitas das quais os fãs brasileiros poderão conferir por aqui. De sucessos como "black", "alive", "daughter", "given to fly" e "better man" a músicas menos conhecidas mas igualmente boas, como "corduroy", "porch" e a nova e uma das minhas preferidas do disco mais recente: "unthought known", o repertório do Pearl Jam é riquíssimo e não fica relegado somente aos seus grandes hits radiofônicos. Não custa lembrar também que os shows no Brasil serão especialíssimos, pois a banda comemora seus 20 anos de estrada ainda com muita coisa a dizer e mostrando definitivamente que é possível combinar integridade e longevidade com sucesso e reconhecimento do público.


Wonder Woman and the Invisible Jets

Mulher Maravilha posando de Joan Jett, junto com suas colegas de banda super-heroínas.
Arte de Cliff Chiang.